Justiça de São Paulo condena advogado por falas homofóbicas
'Vai ser gay na Rússia pra ver o que acontece', disse Celso Machado Vendramini em 2019 durante júri
Na foto, o advogado Celso Machado Vendramini foi condenado a a três anos de serviços e 20 salários mínimos - Foto : Reprodução | Instagram
A Justiça de São Paulo condenou nesta semana o advogado Celso Machado Vendramini a pena de três anos de prestação de serviços comunitários, e pagamento de 20 salários mínimos, por falas homofóbicas durante um júri popular em 2019. Vendramini disse "vai ser gay lá na Rússia pra ver o que acontece" durante julgamento de dois policiais militares acusados de homicídios.
O comentário do advogado é uma referência às medidas LGBTfóbicas que governo russo tem adotado sob o comando de Vladmir Putin. A repressão à comunidade LGBTQIA+ em solo russo já dura mais de uma década.
Em 2020, o chefe de Estado enviou ao Parlamento uma reforma constitucional que proibiu o casamento entre pessoas do mesmo gênero, que é permitida no Brasil.
As falas de Vendramini no julgamento conseguiram convencer os jurados a absolver os PMs que o advogado defendia e que eram acusados de assassinar dois suspeitos de crimes. Na ocasião, os agentes públicos foram julgados como réus por homicídios cometidos dois anos antes, em 2017. Eles negaram os crimes e respondiam ao processo em liberdade.
Vendramini, é conhecido por atuar há mais de 30 anos na defesa de PMs investigados por diversos crimes. Em resposta ao G1, o advogado negou ter sido homofóbico durante o julgamento e que irá recorrer da decisão.
"Ainda confio na Justiça e que os tribunais superiores saberão analisar os fatos e que nego peremptoriamente ter ofendido a comunidade LGBT com falas homofóbicas", disse em nota.
Confira as declarações do advogado, durante o juri em 2019, que foram considerados LGBTfóbicas :
- "O pessoal fala muito da Rússia. Eu sou fã do Putin. Sou fã do Putin. Lá não tem boi não. Lá não tem passeata gay na Rússia não. Vais ser 'viado' lá na, em Cuba pra ver o que acontece. Vai ser gay lá na Rússia pra ver o que acontece";
- “Filho usando azul... filha usando cor-de-rosa... depois, se o filho quiser mudar pra cor-de-rosa, o problema é dele... se a mulher quiser mudar depois para azul, o problema é dela”;
- "Não sou contra segmento LGBT em hipótese alguma [...] cada um respeitando seu espaço";
- “Eu digo assim... às vezes brincando com os colegas... pessoal... vou virar homossexual... depois de velho... 65 anos”;
“Hoje, parece que ser hétero é pecado”
Promotora lésbica estava presente e pediu julgamento das falas
Na foto, a promotora Cláudia Mac Dowell que foi injuriada homofóbicamente pelo advogado Celso Vendramini o que motivou o Ministério Público a acusação - Foto: Reprodução | Instagram
Ao final do júri, a promotora Cláudia Ferreira Mac Dowell solicitou que as falas de Vendramini fossem colocadas na ata do julgamento por entender que elas eram homofóbicas e que foram usadas fora de contexto no julgamento para atacá-la, que na ocasião era representante do Ministério Público.
A promotora é uma mulher lésbica e casada. Ela é conhecida publicamente como ativista dos direitos da comunidade LGBTQIA+. A promotora levou a gravação com as declarações do advogado ao próprio MP e à associação paulista que representa a categoria.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Secretaria de Justiça em São Paulo também abriram procedimentos para apurar a denúncia. O MP denunciou Vendramini à Justiça por dois crimes: homofobia - por entender que ele ofendeu a comunidade LGBTQIA+ com as declarações -, e injúria - pelo fato de as ofensas terem sido direcionadas à promotora.
Na última segunda-feira (31 de julho), a juíza Cynthia Torres Cristófaro, da 23ª Vara Criminal, condenou Vendramini por homofobia, mas o absolveu da acusação de injúria.
"Diante do exposto e do mais que dos autos consta, julgo parcialmente procedentes a denúncia, para o fim de condenar o réu Celso Machado Vendramini [...] às penas de 3 (três) anos reclusão, em regime inicial aberto, substituída por prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas pelo mesmo período de três anos, à razão de uma hora por dia de condenação, e por prestação pecuniária de 20 (vinte) salários mínimos a ser paga a fundo público do Estado de São Paulo ou da União que se dedique à defesa dos direitos da população LGBT+, conforme dispuser o Juízo de execução, e mais 30 (trinta) dias-multa, no valor unitário de um décimo do salário mínimo, bem como para absolvê-lo da imputação do artigo 140 [injúria]", escreveu a magistrada na sentença."
Os valores dos salários mínimos e dos dias-multa ainda serão calculados, porque levarão em conta quanto valiam à época do crime.
Segundo a juíza, os áudios do júri dos PMs demonstraram que o advogado cometeu crime de homofobia, mas não comprovaram se as ofensas foram para Claudia.
No entendimento dela, seria necessário um vídeo para ver se Vendramini se dirigia à promotora, ou olhava para ela, para caracterizar a injúria. Sem as imagens, já que a sessão não foi filmada, não foi possível concluir isso.